terça-feira, julho 01, 2008

Achados no Monte Perdido

Começam as férias com uma travessia pelo pais Vasco, Aragon e Navarra. Um dia na Expo de Zaragoza e começa a parte de montanha.

Alugamos um carro e partimos em direcção a Torla. Demora cerca de uma hora de curvas e túneis e cruzamentos enganados para chegarmos à cidade maior do parque natural. Passamos por inúmeras aldeias navarras com as casas graníticas cinzentas e os telhados pontiagudos para a neve.

Estamos já atrasados quando chegamos ao estacionamento onde deixaríamos o carro. Cerca de 1600m de altitude. Prepara-se as mochilas pequenas, roupa e comida para 2 dias. Falamos com o guarda do parque para nos dar indicações do tempo. Não é preciso, partimos às 17:00 e começa a chover bem.

Fora a chuva, o percurso marcado é fácil e começamos com o passo rápido típico de quem tem muita vontade de começar. Cruzamo-nos com várias pessoas que regressam no sentido oposto.

É impossível descrever o cheiro a terra molhada, a pressão que sentíamos de ter de chegar a tempo ao abrigo na montanha antes de anoitecer, o verdadeiro desconhecido, o cheiro a aventura.


Tudo muito verde, molhado e húmido, não é a chuva que reduz a beleza do percurso que fizemos ao longo dum rio. Pouco a pouco o terreno acentua-se, as águas cada vez mais tumultuosas, transformam-se em cascatas de várias dezenas de metros e já suados e com a chuva bastante forte, chegamos ao inicio do vale com 2 massivos de rochas em redor, cobertos de árvores até ao topo. Imponente! Total sensação de liberdade!

As árvores vão sendo mais escassas à medida que avançamos no vale.

Lindíssimo!

O Monte Perdido surge ao fundo do vale. Ficamos surpreendidos com a quantidade de neve que existe no último cume. Sente-se respeito pelos desafios dos próximos dias.

Vale antes da "cola del caballo" O vale visto de cima perto do abrigo

O vale tem algo de mágico. Cursos de água escorrem dos lados e dão origem a um rio no meio. Um pequeno grupo de vacas pasta na erva encharcada pela chuva. E ao fundo o cume nevado, o monte perdido. É para lá que vamos.

Temos a pressão do tempo do nosso lado! Temos de chegar ao abrigo. Levamos um ritmo intenso, empapados e sobre pressão começamos a subida final, a parte mais dura do primeiro dia.

Não é medo que se sente! É um “estar” ciente dos riscos que se correm…

Umas nuvens pairam sobre o vale e para nosso azar seguem-nos como que a perseguirem-nos na subida.

Visibilidade Zero!

As pedras têm pinturas que assinalam o caminho, é o que procuramos para não nos perdermos. Entramos numa fase em que a dor e o cansaço nos elevam o espírito para um novo nível.

Tocamos a primeira neve e poucos minutos depois chegamos finalmente ao abrigo. Um percurso feito em tempo recorde de 3 horas e meia de caminhada.

O abrigo de Goriz fica a 2136 metros de altitude. Casa de pedra simples, útil, prática. Tudo está feito para aproveitar ao máximo os recursos naturais e para poupar ao máximo todos os bens. Os reabastecimentos aqui só de helicóptero.

Sala e cozinha no piso de baixo. 2 camaratas com 9 beliches de 3 andares cada no primeiro andar da casa. Conforto mínimo.

Estamos felizes de ter chegado, mas não temos banda à espera. Temos um jantar rico e quente à espera:

- Sopa de lentilhas

- Salada Mista

- Carne de porco guisada com cus cus

- Natilhas (parecido com o nosso leite creme)

A única água que nos servem está gelada e vem directamente dos glaciares. Bebo! Para-me a digestão!.

Tenho uma noite horrível com dores de estômago. WC a 60 metros no exterior do abrigo. Está muito frio lá fora, mas o céu está limpo. Uma lua crescente enorme, estou mais perto do céu.

No abrigo levanta-se e deita-se tudo muito cedo. Acordamos às 5 da manhã, toma-se um pequeno almoço ligeiro, parte-se rumo ao topo, 3310 metros.

O sol brilha, mas ao fim de alguns metros temos neve. Muita neve que se derrete rapidamente.

Subimos a muito custo! Não temos equipamento adequado. Passam por nós verdadeiros profissionais, esquis, crapones, bastões nas mãos, sobem ziguezagueando, parece fácil.

A neve entra nas botas, enterramo-nos por vezes até à cintura, tropeçamos, caímos, mãos na neve.

Quando avistamos os 3000 metros desistimos, a inclinação impossibilita o nosso avanço. Nestas altitudes o clima muda drasticamente. Chove a potes. Descemos ao abrigo.


Que ambiente se vive nos abrigos de montanha. Fala-se pouco no abrigo. Uns apanham sol, outros estão exaustos demais para fazer o quer que seja. Há outros que se deitam logo e tentam recuperar energias para o dia seguinte. Prepara-se equipamentos. Rações. Limpam-se as botas, põe-se roupa a secar perto duma estufa. Poucos têm coragem de tomar banho de água gelada.


Estão todos muito felizes de ali estar! Pouco conforto, mas muita aventura, liberdade total, levar o corpo a limites. Apenas querem aproveitar ao máximo o que natureza tem de mais belo e escapar da realidade da rotina diária.


Algumas fotos comentadas dos 3 dias na montanha. Clicando nas mesmas vêem-se maiores.


Paisagens do 2º dia, da esquerda para a direita: Topo de uma catarata; desgelo; apanhado em acção;

Alguns obstáculos ultrapassados com mais ou menos perícia:



O momento glorioso na altura máxima atingida:


As fotos national geographic: Um mangusto surpreendido por trás deita-se no extremo da falésia a vigiar o vale; Bovinos aproveitam o vigoroso sol da manhã para exercitar corpo;



As mais impressionantes paisagens:

Sem comentários: