Achados no Monte Perdido
Começam as férias com uma travessia pelo pais Vasco, Aragon e Navarra. Um dia na Expo de Zaragoza e começa a parte de montanha.
Alugamos um carro e partimos em direcção a Torla. Demora cerca de uma hora de curvas e túneis e cruzamentos enganados para chegarmos à cidade maior do parque natural. Passamos por inúmeras aldeias navarras com as casas graníticas cinzentas e os telhados pontiagudos para a neve.
Estamos já atrasados quando chegamos ao estacionamento onde deixaríamos o carro. Cerca de 1600m de altitude. Prepara-se as mochilas pequenas, roupa e comida para 2 dias. Falamos com o guarda do parque para nos dar indicações do tempo. Não é preciso, partimos às 17:00 e começa a chover bem.
Fora a chuva, o percurso marcado é fácil e começamos com o passo rápido típico de quem tem muita vontade de começar. Cruzamo-nos com várias pessoas que regressam no sentido oposto.
É impossível descrever o cheiro a terra molhada, a pressão que sentíamos de ter de chegar a tempo ao abrigo na montanha antes de anoitecer, o verdadeiro desconhecido, o cheiro a aventura.
Tudo muito verde, molhado e húmido, não é a chuva que reduz a beleza do percurso que fizemos ao longo dum rio. Pouco a pouco o terreno acentua-se, as águas cada vez mais tumultuosas, transformam-se em cascatas de várias dezenas de metros e já suados e com a chuva bastante forte, chegamos ao inicio do vale com 2 massivos de rochas em redor, cobertos de árvores até ao topo. Imponente! Total sensação de liberdade!
As árvores vão sendo mais escassas à medida que avançamos no vale.
Lindíssimo!
O Monte Perdido surge ao fundo do vale. Ficamos surpreendidos com a quantidade de neve que existe no último cume. Sente-se respeito pelos desafios dos próximos dias.
Vale antes da "cola del caballo" O vale visto de cima perto do abrigo
O vale tem algo de mágico. Cursos de água escorrem dos lados e dão origem a um rio no meio. Um pequeno grupo de vacas pasta na erva encharcada pela chuva. E ao fundo o cume nevado, o monte perdido. É para lá que vamos.
Temos a pressão do tempo do nosso lado! Temos de chegar ao abrigo. Levamos um ritmo intenso, empapados e sobre pressão começamos a subida final, a parte mais dura do primeiro dia.
Não é medo que se sente! É um “estar” ciente dos riscos que se correm…
Umas nuvens pairam sobre o vale e para nosso azar seguem-nos como que a perseguirem-nos na subida.
Visibilidade Zero!
As pedras têm pinturas que assinalam o caminho, é o que procuramos para não nos perdermos. Entramos numa fase em que a dor e o cansaço nos elevam o espírito para um novo nível.
Tocamos a primeira neve e poucos minutos depois chegamos finalmente ao abrigo. Um percurso feito em tempo recorde de 3 horas e meia de caminhada.
O abrigo de Goriz fica a 2136 metros de altitude. Casa de pedra simples, útil, prática. Tudo está feito para aproveitar ao máximo os recursos naturais e para poupar ao máximo todos os bens. Os reabastecimentos aqui só de helicóptero.
Sala e cozinha no piso de baixo. 2 camaratas com 9 beliches de 3 andares cada no primeiro andar da casa. Conforto mínimo.
Estamos felizes de ter chegado, mas não temos banda à espera. Temos um jantar rico e quente à espera:
- Sopa de lentilhas
- Salada Mista
- Carne de porco guisada com cus cus
- Natilhas (parecido com o nosso leite creme)
A única água que nos servem está gelada e vem directamente dos glaciares. Bebo! Para-me a digestão!.
Tenho uma noite horrível com dores de estômago. WC a 60 metros no exterior do abrigo. Está muito frio lá fora, mas o céu está limpo. Uma lua crescente enorme, estou mais perto do céu.
No abrigo levanta-se e deita-se tudo muito cedo. Acordamos às 5 da manhã, toma-se um pequeno almoço ligeiro, parte-se rumo ao topo, 3310 metros.
O sol brilha, mas ao fim de alguns metros temos neve. Muita neve que se derrete rapidamente.
Subimos a muito custo! Não temos equipamento adequado. Passam por nós verdadeiros profissionais, esquis, crapones, bastões nas mãos, sobem ziguezagueando, parece fácil.
A neve entra nas botas, enterramo-nos por vezes até à cintura, tropeçamos, caímos, mãos na neve.
Quando avistamos os 3000 metros desistimos, a inclinação impossibilita o nosso avanço. Nestas altitudes o clima muda drasticamente. Chove a potes. Descemos ao abrigo.
Que ambiente se vive nos abrigos de montanha. Fala-se pouco no abrigo. Uns apanham sol, outros estão exaustos demais para fazer o quer que seja. Há outros que se deitam logo e tentam recuperar energias para o dia seguinte. Prepara-se equipamentos. Rações. Limpam-se as botas, põe-se roupa a secar perto duma estufa. Poucos têm coragem de tomar banho de água gelada.
Estão todos muito felizes de ali estar! Pouco conforto, mas muita aventura, liberdade total, levar o corpo a limites. Apenas querem aproveitar ao máximo o que natureza tem de mais belo e escapar da realidade da rotina diária.
Algumas fotos comentadas dos 3 dias na montanha. Clicando nas mesmas vêem-se maiores.
Paisagens do 2º dia, da esquerda para a direita: Topo de uma catarata; desgelo; apanhado em acção;
Alguns obstáculos ultrapassados com mais ou menos perícia:
O momento glorioso na altura máxima atingida:
Sem comentários:
Enviar um comentário